segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Feminino Plural - Pagu

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Quem foi Pagú?
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Patrícia Rehder Galvão teve uma vida curta - apenas 52 anos. Mas este pequeno percurso foi marcado pela intensidade. Nasceu a 9 de julho 1910, no interior paulista, em São João da Boa Vista, filha de uma tradicional família burguesa paulista. Sempre teve personalidade forte, e já na adolescência, enquanto frequentava o curso Normal, alimentava em seu coração rebelde o sonho de conhecer o Cavaleiro da Esperança, Luis Carlos Prestes, líder do Partido Comunista do Brasil.
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Patrícia era provocante... inteligente e culta, com os lábios pintados de roxo e grandes argolas nas orelhas, declamava seus versos satíricos para os estudantes da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, em SP. Apesar de sua insolência, seu linguajar pouco recomendável para uma moça da época e seu modo de vestir extravagante, fascinava a todos com o poder de sedução de seus intensos e brilhantes olhos verdes. Foi ousada, corajosa, moderna e, sobretudo, humanista.
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Na provinciana São Paulo de sua época, corriam histórias malucas a respeito de Patrícia: fugas, pulando janelas e muros da escola, cabelos cortados e eriçados, blusas transparentes com grandes decotes, cigarros fumados em plena praça pública... um escândalo, para a época!
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Sua rebeldia fez com que logo fosse notada pelo diretor de cinema Olympio, através do qual conheceu o poeta e futuro embaixador do Brasil na Europa, Raul Bopp, que encantou-se pela moça, dando-lhe o apelido de Pagú e introduzindo-a na mais fina flor da sociedade intelectual de São Paulo.


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Neste novo círculo cai nas graças do casal Oswald de Andrade e sua mulher Tarsila do Amaral, que simpatizam com a jovem ousada e excêntrica e logo cuidam de promovê-la, montando uma sensacional apresentação de suas poesias no Teatro Municipal de São Paulo, com a intenção de provocar um escândalo... Foi um sucesso, e Pagú ficou consagrada como musa da poesia surrealista brasileira.
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Com a convivência, surge um romance entre Pagu e Oswald de Andrade. É então que entra em cena o pintor Waldemar Belisário, com quem Pagu se casa em 1928 numa cerimônia civil pró-forma, já que, após o ato, Oswald recebe a noiva do próprio Belisário, no alto da serra de Santos, enquanto o pintor volta a São Paulo... e o casamento de Pagu e Waldemar foi anulado em fevereiro de 1930.
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Então mais um escândalo acontece: Pagu e Oswald de Andrade realizam uma cerimônia de casamento poético num cemitério, em frente ao jazigo da família do escritor! Dessa união nasceria-lhes um filho: Rudá.
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E o escandaloso casal resolve então, em 1931 fundar um jornal chamado "O Homem do Povo". Pagú escrevia uma coluna chamada: "Mulher do Povo". Era um tablóide irreverente, e logo teve sua sede destruída pelos estudantes da Escola de Direito do Largo de São Francisco, irados e revoltados com a temática do jornal, que versava mais ou menos assim, nas críticas de Pagú:
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"Senhoras que cospem na prostituição, mas vivem sofrendo escondidas num véu de sujeira e festinhas hipócritas e maçantes, onde organizam o hino de cornetas ligados pra todos os gozos, num coro estéril mas barulhento."
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“...o homem nascido no Brasil, em Cuba, na China ou na Rússia, nestes tempos, não tem necessidade de nenhum ‘pai dos pobres’, de ‘paizinho’, quer se chamem Getúlio Vargas ou José Stálin”. Que as massas atirassem fora a “humildade”, pois era sobre esta que se estendia “a asa negra dos diversos ‘pais’ que a si mesmo se nomearam, como se os povos fossem formados de órfãos e bastardos...”.
Pagú
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Inevitavelmente acontece uma intensa participação de Pagú na vida política e na militância do Partido Comunista. Numa viagem a Buenos Aires, ela realiza o sonho de conhecer Luis Carlos Prestes. Em agosto de 1931, Pagu é presa depois de participar de um comício político em Santos, sendo encaminhada ao Cárcere na Praça dos Andradas, a pior cadeia da América Latina naquela época - hoje, no local, funciona o Centro Cultural Pagú. Este episódio foi mais um marco na vida de Pagú - um triste marco, na verdade, como a primeira mulher presa política e torturada no Brasil. Sua luta contra a ditadura de Getúlio Vargas, iniciada na década de 30, quando tinha apenas 21 anos, foi dura e torturosa, marcada por prisões - mais de 20 - e torturas.
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Em 1933, usando o pseudônimo de Mara Lobo, Pagu publica o romance proletário "Parque Industrial", um dos livros mais importantes da década de 30, com uma linguagem desabusada, abordando questões que eram tabu, ja que Pagú colocava suas idéias em favor de um povo sofrido, no combate a uma burguesia intolerante e inconsciente.
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"O apito da chaminé gigante, libertando uma humanidade inteira que se escoa para as ruas da miséria."
Pagú, in Parque Industrial
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Ainda em 1933, em dezembro, começa uma viagem pelo mundo, enviando reportagens para jornais como o Diário de Notícias e o Correio da Manhã cariocas e o Diário da Noite paulistano. O itinerário: Rio, Belém, Califórnia, Japão, China, Rússia, Polônia, Alemanha, França. Encontros: Sigmund Freud num navio, George Raft, Raul Roulien e Miriam Hopkins, em Hollywood, Raul Bopp, em Cobe, no Japão. Na China, cobre a coroação do primeiro imperador da Mandchúria, do qual torna-se amiga, e de quem recebe sementes de soja para trazer ao Brasil. Entrevista Sigmund Freud. Decepciona com o stalinismo na URSS, conforme comenta por carta com Oswald: "Isto aqui é jantar frio sem fantasias. Tou besta."
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Em Paris, ingressa nas Jenesses Communistes e é ferida numa manifestação de rua, ficando hospitalizada por três meses. Ao voltar ao Brasil, ainda sentindo os efeitos dos ferimentos, separa-se de Oswald de Andrade.
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Em 1940, depois de uma difícil passagem pela prisão, abandonada pelo PCB, ferida, deprimida e ressentida com os companheiros de partido, Pagú vai vier com o jornalista Geraldo Ferraz, grande companheiro de sua vida, com o qual ficaria até o final de seus dias e teria um filho, Geraldo Galvão Ferraz.
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"depois das rajadas de tempestade, colaremos nas retinas úmidas os últimos retalhos de azul ..."
Pagú
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Começa então uma fase produtiva: publica artigos no jornal A Vanguarda Socialista, de Mário Pedrosa e, após o reencontro com seu filho Rudá, então com 17 anos, escreve o lindo livro "Não Tenha Medo, Rapaz." Começa o curso na Escola de Arte Dramática de São Paulo e promove espetáculos em Santos, lutando pela construção de um teatro na cidade.
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Pagú faria duas tentativas frustradas de suicídio. A primeira em 1949, e a segunda após descobrir que tinha câncer. Viajou para Paris, pois queria morrer no exterior, escondida de todos. Mas retorna para morrer junto à família, em Santos, em 12 de dezembro de de 1962, fazendo seu último apelo pela liberdade:
"abram as janelas, desabotoem minha blusa, quero respirar."
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Saiba mais sobre Pagú aqui..

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UPDATE:

Comentários que enriquecem um post:
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Luma Rosa disse...
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A curiosidade do apelido, vem do fato que Bopp confundiu o sobrenome Galvão com Goulart. Achou que fosse Patrícia Goulart, juntou as duas sílabas e ficou Pagú.

"Pagú tem os olhos moles
uns olhos de fazer doer
Bate-coco quando passa
Coração pega a bater"

trecho do poema de Raul Bopp, que deu origem ao nome Pagú.

Lembro que a pouco tempo, foi noticiado que uma catadora de papel encontrou pelas ruas de Santos, Jogados no lixo, fotos e documentos originais da escritora e do jornalista Geraldo Ferraz, seu último companheiro. Entre os achados, uma foto de Pagú, com dedicatória para Geraldo.

Imagino o quanto da história perdemos e maravilhoso este seu resgate! :=)))

Beijus,

************************

Leia aqui o episódio da catadora de papéis Selma Sarti, citado acima pela Luma.

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13 comentários:

* Edméia * disse...

*Dalvaaaaaaaaaaa !!! *

*Como você está ?! Tudo bem ?!

*Como fôstes de festas de final

de ano ?! Todas tranquílas e

alegres ?!

*Bom, eu, estou curtindo os

meus últimos dias de *Férias !!!

Logo iniciarão os meus

compromissos de professora !!!

*Dalva, você já está adicionada

às minhas listas de amigos do

MSN ?! Se não, posso pegar este

teu e-mail do Yahoo e te

adicionar ?! (*Na parte de assunto

digitarei : "Da Profª Maria

Edméia para a amiga Dalva ! ").

*No Hotmail, tenho uma lista

só com os endereços eletrônicos

dos amigos daqui da

*Blogosfera !!! (*Modéstia à

parte, a maioria gosta muito dos

textos que periodicamente os

envio !!! ).

*Falando deste *Post sobre a

maravilhosa *Pagu ... menina,

como você foi FELIZ com a idéia

desta postagem !!! De fato, *Pagu

foi uma mulher singular,

especial !!! *Parabéns !!!

*Dalva, tenhas uma EXCELENTE

semana !!!

*Fiques com Deus.

*Ah, ótimo 2010 para *Você

e para todos os seus !!!

*Gosto de Você !!! *

*Um abraço.

Sandra disse...

Muitas curiosidades aqui amiga. Interesssante. a rebeldia já existia desde lá.
Um linda mulher..
voltarei para terminar de ler.

Agradeço o seu carinho e retribuo a sua amizade.
Passe no blog da Curiosa e pegue acesso aos blogs Poetas um Voo Livre e Sinal de Liberdade.
Tem selinho lá para vc.
Te espero.
São bem especiais.
Com muito amor eu te espero lá.
Sandra

lis disse...

Oi Dalva
Muito bom texto sobre essa brasileira irreverente e ousada.
O filme Eternamente Pagu foi muito comentado ,mas nao cheguei a ve-lo, boa oportunidade de procurar ver agora.
Cheguei das férias e to passando também pra te deixar um abraço amigo.
Depois volto

Tucha disse...

Salve as revolucionárias ... são elas que fazem este mundo se transformar e seguir renovado.

Vi há muito tempo um filme inspirado na vida de Pagú, e desde então passei a admirá-la. A sua homenagem esta a altura da personagem.

maria claudete disse...

Parabéns Dalva por resgatar para nós a trajetória desta mulher que rotulo Libertária e adiante do seu tempo.

http://saia-justa-georgia.blogspot.com/ disse...

Eu já conhecia a história dela de um seriado que tenho aqui em casa. Ela foi uma mulher vibrante e muito louca para a sua época.

Gosto desses seu tipo de post, super informativo.

Parabéns!

chica disse...

Uma mulher que fez história realmente com seu modo de ser, independenrte e irreverente, ousado.Lindo post,Dalva.Obrigado pela interação no sementinhas e já anexei ao texto.Teu nome, basta clicar, entra aqui.Lindo dia,chica

Leci Irene disse...

Bom dia,menina! Linda página a tua. Amei. Voltarei. Seguirei.
Beijossssssss

ANALUKAMINSKI PINTURAS disse...

Olá, minha cara! Que linda está esta postagem! Adoro retratos antigos... exercem sobre mim certa fascinação, com seu véu de mistério, envolvendo as figuras que parecem flutuar no tempo... Abraços alados azuis e um ano pleno de arte e luz para ti!

Mylla Galvão disse...

Ei Dalva,

Sabe? Ela (Pagú) e eu temos o mesmo sobrenome: Galvão...

E as más línguas daqui falam q Galvão tem estopim curto mesmo...
Gostam de se fazer percerber... chamar a atenção...

Adorei saber mais sobre ela!!!

Sou apaixonada pelo meu sobrenome!!!

bjão

Luma Rosa disse...

A curiosidade do apelido, vem do fato que Bopp confundiu o sobrenome Galvão com Goulart. Achou que fosse Patrícia Goulart, juntou as duas sílabas e ficou Pagú.

"Pagú tem os olhos moles
uns olhos de fazer doer
Bate-coco quando passa
Coração pega a bater"

trecho do poema de Raul Bopp, que deu origem ao nome Pagú.

Lembro que a pouco tempo, foi noticiado que uma catadora de papel encontrou pelas ruas de Santos, Jogados no lixo, fotos e documentos originais da escritora e do jornalista Geraldo Ferraz, seu último companheiro. Entre os achados, uma foto de Pagú, com dedicatória para Geraldo.

Imagino o quanto da história perdemos e maravilhoso este seu resgate! :=)))

Beijus,

Lilá(s) disse...

Li com grande interesse este post, não conhecia. Fabulosa esta informação, adorei também as imagens.
Bjs

Valéria Russo disse...

LINDA ESTRELA..
só mesmo sua sensibilidade pra resgatar e trazer pra nós PAGÙ!!!!
PAGÚ..foi o amanhecer de novos tempos para a sociedade em geral e pricipalmente pra sociedade feminina, tão retrograda, moralista e oprimida..
pagú foi um marco em nossa história politica, é pena que não deem o devido mérito a ela...muitos jovens hoje, não sabem quem foi pagú...e o quanto ela esteve a frente de seu tempo desbravando caminhos de lama para que as mulheres possam hoje caminhar em flores...
amei!!!parabéns pelo texto.
bjuivos no coração.
loba.

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