segunda-feira, 31 de maio de 2010

Feminino Plural - Jane Avril

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Quem foi Jane Avril?
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Em 9 de Junho de 1868 nascia, em Paris, a menina Jeanne Louise Beaudon. Seu nascimento foi fruto de um relacionamento fora do casamente, entre um aristocrata italiano, o Conde Luigi di Font, e Elise Richepin. Quando a filha nasceu, o pai as abandonou. Esse foi o quadro da infância de Jeanne: um pai ausente e uma mãe alcoólatra, que a espancava frequentemente, num ambiente de miséria e privação. Mas todas estas adversidades que condenariam simples mortais a uma vida de anonimato e infelicidade, não foram empecilho para o que Jeanne viria a ser.
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Os avós cuidaram para que Jeanne fosse educada pelas freiras de um convento, onde a menina recebeu um bom nível de educação. Mas depois que eles morreram em 1877, aos nove anos, sua mãe Elise descobriu seu paradeiro e retirou-a do convento. Começava, então, para Jeanne, um perído de infelicidade e lágrimas. Os anos não tinham sido bons para Elise e ela fazia uso de drogas e álcool. Seu caso infeliz com o conde de Font era passado, e agora seus amantes eram homens menos distintos.
A vida das duas era um terror: Jeanne era espancada pela mãe e obrigada a fazer todo o serviço de casa sob impropérios e insultos, enquanto Elise ganhava fama de mulher de má reputação. Jeanne perdia, assim, sua alegria e seus lindos olhos azuis foram se tornando mais e mais profundos.
Os amantes de Elise davam um certo sustento econômico para que Jeanne pudesse continuar seus estudos. Era boa aluna em matemática, línguas, dança e bordados. Jeanne se sentia feliz na escola. Em casa, no entanto, as agressões continuavam.
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Com o passar do tempo Elise parou de receber dinheiro dos seus amantes, e disse a Jeanne que teria de abandonar os estudos e começar a trabalhar. Ela ficou mortificada e seus professores notaram seu abatimento e fizeram com que Jeanne se abrisse sobre o que se passava em casa. Uma freira, Irmã Berthe, foi então visitar Elise e disse a ela que se continuasse a espancar a filha daria parte dela à polícia e que o convento se encarregaria de dar a ela ensino gratuito até a primeira comunhão. E assim Jeanne pode completar seus estudos.
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Em conseqüência dos abusos e violência sofridos, Jeanne fugiu de casa aos 16 anos e foi viver pelas ruas, tornando-se uma fugitiva assustada, que incomodava a sociedade parisiense. Caçada pelas autoridades policiais, Jeanne foi presa e diagnosticada de doença mental, o que causou seu internamento em um manicômio, no Hospital Salpêtrière.
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Mesmo num ambiente tão hostil, entre loucos, doentes e mutilados, a tenacidade e vontade de sobreviver de Jeanne foram cruciais para que superasse as adversidades. Os funcionários do Hospital organizaram uma festa para os pacientes da ala psiquiátrica. E nesta festa a jovem Jeanne levantou-se e começou a dançar. Percebeu-se então que a menina tinha talento para a dança, para o espetáculo e para o exibicionismo.
Jeanne deixou a todos impressionados com sua alegria, e eles começaram a pensar que talvez ela não fosse mentalmente doente, apesar de tudo. Tratava-se apenas de uma menina que tinha sofrido maus tratos, que tinha sido neglicenciada, privada de amor e carinho. E Jeanne parecia ter encontrado na dança uma válvula de escape para tudo isto.
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Foi então liberada do hospital. Em vez de voltar para a casa de sua mãe, Jane decidiu aproveitar sua liberdade e conhecer a bela Paris, decidida a ir ao encontro do seu destino. Passou então a se apresentar nos Cafés e Cabarés de Montmartre, e descobriu que a dança era a sua vocação.
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Neste tempo Jeanne fez amizade com poetas e pintores – tinha muitos “protetores” e teve casos amororsos e amizades platônicas com amigos do sexo masculino. Vivia em função da dança, somente para receber aplausos. Dançava para seu próprio prazer. Como conseqüência Jeanne tornou-se personalidade conhecida no Quartier Latin. Foi nesta época que conheceu o escritor inglês Robert Sherard, com quem teve um envolvimento amoroso. Foi ele que colaborou para que Jeanne se tornasse Jane Avril. Jane é o nome em inglês para Jeanne e Avril é “Abril” - a época do ano “Paris na Primavera”. Nascia assim, Jane Avril.
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E não demorou muito para que ela chegasse ao grande Moulin Rouge, a nata das casas noturnas de Paris.
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A grande musa do Moulin Rouge na época, Louise Weber, “La Goulue”, estava se aposentando e precisavam de uma substituta. E foi assim que Jane foi contratada para ocupar o lugar de La Goulue. Em vez de ficar assustada com tamanha responsabilidade, ela demonstrou estar mais do que pronta para o desempenho das funções, com um estilo mais gracioso e feminino do que sua antecessora. Com seu jovem corpo mais magro e ágil, dançava com suavidade e muito charme. Jane foi responsável pela identidade do célebre Moulin Rouge. Foi um sucesso instantâneo, e os freqüentadores da vida noturna parisiense deram à graciosa, refinada e melancólica Jane um lugar no seu coração. Entre eles estava o grande pintor francês Toulouse-Lautrec, figura fácil da noite parisiense.
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Jane e Lautrec tornaram-se amigos muito íntimos e possivelmente mantiveram um breve romance. Lautrec sentia-se imensamente atraído por ela, não apenas por seu desempenho no palco, mas pela tristeza que via no seu interior, as cicatrizes das dores de sua adolescência difícil. Lautrec reconheceu em Jane um ser solitário por natureza, em contraste com a vida agitada que levava. A ligação entre os dois foi muito forte, justamente pelo fato de ambos serem tão estranhos em alguns aspectos. Alguns dos cartazes e litografias mais famosos de Lautrec têm Jane como assunto.
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Jane foi uma das responsáveis pela consolidação da identidade do Moulin Rouge, criado em 1889. Protegida de Zidler, o gerente, tinha certas liberdades que não eram concedidas as outras dançarinas. Jane era a única dançarina do can-can que podia usar ceroulas vermelhas, ao invés do branco usado por todas as outras! E assim ela fazia seu próprio estilo.
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Fora do palco era uma das mulheres mais bem vestidas e elegantes da cidade. Sua fama começou a espalhar-se para além das fronteiras da França. Raramente se misturava aos demais dançarinos. Vivia entre os escritores e artistas
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Em 1910 Jane deu a luz um filho e casou-se com o artista Maurice Biais. Encerrou assim a sua carreira de dançarina para dedicar-se ao marido e ao filho, numa vida calma longe de Paris. Mas seu casamento foi infeliz. O marido estava constantemente ausente, e morreu em 1926, deixando-a pobre e sem condições. Cumpria-se um círculo na vida de Jeanne: de volta a uma vida de anonimato e pobreza. Voltava a ser a menina solitária de antes...
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Mas alguns admiradores persistentes redescobriram Jane Avril em 1941 e tentaram arrancá-la da obscuridade e honrá-la com um “grand-finale”, um tributo a sua carreira em Paris. E uma Jane de cabelos brancos, ex-musa adolescente de Paris, se apresentou nos palcos mais uma vez, numa perfomance para uma platéia de fãs. Mais uma vez ela deslumbrava o público como fazia antigamente no Moulin Rouge. Podemos imaginar o gosto que esse momento teve para ela. Certamente lembrou-se de tudo que tinha vencido: os maus tratos da infância, a ala psiquiátrica do hospital... e ela fazia isso de novo! Como deve ter sido doce para ela saber que não fora esquecida, que seu nome ainda significava alguma coisa para o público.
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Jane morreu em 1943, com 75 anos, em um lar para idosos. Seu corpo foi entrerrado no cemitério Père-Lachaise, em Paris
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Conheça muito mais sobre Jane aqui.

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6 comentários:

Pandora disse...

Que menina linda!!! Que vida dificil que ela teve, meu Deus essas mulheres do inicio do século XX tem um que de garra que me encanta, a força, a graça, a coragem para romper fronteiras e tentar vencer qualquer adversidade!!!

Beijão\o/

Valéria Russo disse...

LINDA ESTRELA..
QUE HISTÓRIA DE VIDA DESSA ARTISTA, REALMENTE UMA VENCEDORA DENTRE TANTAS ADVERSIDADES...
ADOREI COMO SEMPRE.
BJUIVOS NO CORAÇÃO.
TENHA UMA SEMANA MARAVILHOSA.

DILERMArtins disse...

Mas bah, guria.
Sou fã do seu "Feminino Plural".
Parabéns por mais esta jóia.
Abração.

http://saia-justa-georgia.blogspot.com/ disse...

Dalva, quantas dificuldades na vida de Avril. Nao é fácil sair de um mundo desses sem marcas...

Adoro essa tua série, continue escrevendo, pois venho me deliciar qui com teus relatos onde aprendo muitíssimo.


Parabéns!

Boa semana

Jr Vilanova disse...

Já falei algumas vezes que sou fã dessa sua iniciativa, não já? Pois é, mais um ponto pra você, Dalva!

Blog´s como o seu enriquecem a internet e proliferam cultura e isso já é um motivo mais que especial para que eu seja seu fã!

Muito legal seu texto.
Jr.

Ester disse...

Explêndido!
Uma história de superação, comovente e linda!

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