terça-feira, 17 de novembro de 2020

O toque do vento

 


Tu sempre disseste que gostava do cheiro que tenho na curva do meu pescoço, naquele lugar onde começa o ombro. Eu escutava e ficava a pensar: isso lá é coisa que se goste? Gosto de perfumes com toque cítrico, sempre usei algumas gotinhas, neste teu lugar preferido. Quando falavas assim, ficava parada, te olhando. Dizias que esse pedacinho meu era uma espécie de resumo de mim toda. Que a pele ali era mais macia, o calor mais sensível... Me encolhia toda quando falavas assim, e nunca soube o que te responder. Nunca soube que palavras escolher para te dar em troca desse presente que me davas.
Não sei porque hoje lembrei-me disso. Talvez seja esse vento de final de primavera, abafado, que traz um cheiro de verão no ar.  O certo é que lembrei-me e encostei o rosto no ombro, pensando em ti. Lembrei também dos teu beijos, sempre apertados, em contraste com teu toque suave nos meus ombros. Naqueles dias tu me davas a impressão de estar sempre a pedir mais - mais alguma doçura, mais alguma promessa. E eu a te olhar, sorrindo. E tu me sorrias de volta, sempre.
Esse vento que sopra quente me sufoca com tudo o que não te disse, com os carinhos que não te fiz. O calor do vento me provoca arrepio no ombro - como teus dedos costumavam fazer. Me arde o olhar e afasto o pensamento de levinho, prá não chorar.

 

 

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