quarta-feira, 18 de junho de 2025

Tudo o que posso fazer é ser eu

 



Mas se eu não souber, prometo que invento. No tom da invenção, tudo é mais nobre ao coração. Levarei em conta as nossas juras, enquanto conto as contas de minhas agruras.

Serei eu, mais íntimo, mais honesto e mais ligeiro, ainda que minha maior promessa não lhe seja essa.

Eupaitio Caska 


"Tudo que posso fazer é ser eu."  Bob Dylan


Crédito da imagem: Fotografia de Rachel Prado




As estrelas cheiram

 



de um esbarrão no meio da rua, entre chuva e buzinas,
as lembranças aos goles da "melhor" cachaça de Minas e
café de botequim...
ele trouxe Volta Grande Leopoldina Trimonte Porto Novo
a Zona da Mata inteirinha, tamborilando as canções que os seresteiros
deixavam pelas noites no Pontal, quando por lá passavam...

fui longe muito muito, visitei meus sete anos e a voz baixa e doce de meu avô
me ensinando que as estrelas cheiram:
- feche os olhos, não abra, respire fundo, fundo, sente o perfume?
- sinto, estrela cheira bem forte e pra sempre, né?!
...até hoje sei porque sinto que estrela cheira a jasmim..

Lucia de Moura Chamma





Crédito da imagem: Fotografia de Dorothea Lange - Young Girl






quarta-feira, 21 de maio de 2025

A memória

 


A memória é um museu, uma variedade imensa de estátuas e quadros; uns, animados pela dor, outros, pela alegria. E todos surgem ao luar que encontra a noite do Passado. Surgem, velados de uma ternura dolorida, que é uma névoa de lágrimas não choradas.


Teixeira de Pascoaes



Crédito da imagem: Arte de Muhammad Fatchurofi





Como é que, de um dia para o outro, a tua voz deixou de me procurar?

 

Arte: Max Gasparini

Arrumei os amores, é a primeira regra da vida – saber arquivá-los, entendê-los, contá-los, esquecê-los. Mas ninguém nos diz como se sobrevive ao murchar de um sentimento que não murcha. A amizade só se perde por traição – como a pátria. Num campo de batalha, num terreno de operações. Não há explicações para o desaparecimento do desejo, última e única lição do mais extraordinário amor. Mas quando o amor nasce protegido da erosão do corpo, apenas perfume, contorno, coreografado em redor dos arco-íris dessa animada esperança a que chamamos alma – porque se esfuma? Como é que, de um dia para o outro, a tua voz deixou de me procurar, e eu deixei que a minha vida dispensasse o espelho da tua? (...)

Em que dia me abandonaste? Em que palavra a minha voz se partiu? Que sombra se abriu por dentro dos teus olhos para despedaçar a minha imagem?

Inês Pedrosa
(excerto)


quinta-feira, 15 de maio de 2025

Diga-me com toda a sinceridade

 



Eu não aguento mais. Todo dia, há três semanas, eu falo para mim: hoje direi tudo, e saio com a mesma aflição, medo e felicidade no coração. E toda noite, como agora, eu relembro o que se passou, sofro e me pergunto: por que não disse e como direi? Eu trago comigo essa carta para entregá-la a você, caso mais uma vez eu não possa ou não tenha coragem de lhe dizer tudo diretamente. [...] Você, pessoa honesta, com toda sinceridade e sem pressa, pelo amor de Deus, sem pressa, diga-me o que fazer. Do que se ri agora, chora-se depois. Eu morreria de rir, se um mês atrás você me dissesse que seria possível sofrer, como sofro agora, e sofro feliz. Diga com toda a sinceridade: gostaria de ser minha esposa? Diga “sim” só se for de todo coração e sem medo, mas se tiver alguma sombra de dúvida é melhor dizer “não”. Pelo amor de Deus, pergunte bem a si mesma. Eu tenho pavor de ouvir “não”, mas eu prevejo isso e encontrei forças para suportar. Porém, se jamais serei um marido tão amado como a minha esposa é amada por mim, isso será ainda mais terrível.⠀⠀⠀⠀⠀⠀

— Carta de Liev Tolstói a Sófia Andrêievna. Em: BASSÍNSKI, Pável. Tolstoi: A fuga do paraíso / Pável Bassínski; tradução de Klara Guriánova. — São Paulo: LeYa, 2013.

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(Foto: Tolstói e sua esposa Sophia, Rússia, 23 de set. de 1910. Eles são retratados aqui em seu último aniversário de casamento. Tolstoi morreu de pneumonia pouco menos de dois meses depois. [Foto: Fine Art Images/ Heritage Images/Getty Images.]).




Flores no cabelo

 


Tu és o meu dia de festa. Quando em sonhos me junto a ti, tenho sempre flores nos cabelos. Desejaria colocar-te flores nos cabelos. Quais? Nenhuma tem a simplicidade comovente que deveria, nenhuma é suficientemente simples. Em que Maio colhê-las? — Mas creio agora que tens sempre nos cabelos uma grinalda — ou uma coroa... Nunca te vi de outro modo.

Nunca te vi, que não tivesse o desejo de te rezar. (…)


René
In "Correspondência Amorosa, Rainer Maria Rilke e Lou Andreas-Salomé                
                                            '

Imagem via Google




quarta-feira, 14 de maio de 2025

Adeus

 


— Então, isto é um adeus? — perguntou Alice, sua voz carregava tristeza, mas um sorriso forçado tentava disfarçar.

O Chapeleiro, com um olhar profundo, respondeu:

— Se você acha que isso é um adeus, então realmente não me conhece. O adeus é uma ilusão; você nunca se vai de verdade. Quem te guarda na memória sempre te traz de volta. 

Despedir-se é não compreender o verdadeiro sentido de partir, porque para dizer adeus você teria que apagar cada vestígio de sua existência. E isso, minha querida Alice, é impossível. 

Eu jamais deixarei você ir, assim como você jamais se libertará de mim. Chame isso de tortura ou de maldição, mas eu prefiro pensar que você é o meu espelho. E ninguém pode escapar do próprio reflexo.

Então o Chapeleiro suspirou, um sorriso louco brilhou em seus olhos:

— Vou seguir você até onde for preciso.

( Alice no País das Maravilhas ) 




domingo, 11 de maio de 2025

O homem maduro

 


Dizem que o tempo faz o homem amadurecer. Eu não acredito nisso. O tempo torna o homem mais medroso, e o medo torna-o conciliador, e, ao ser conciliador, procura aparecer perante os outros de forma que o acreditem maduro. E com o medo vem a necessidade de afeto, de algum calor humano para se proteger do frio do universo. Quando falo de medo, não me refiro simplesmente, nem em particular, ao medo pessoal: o medo da morte, da decrepitude, da penúria ou qualquer outra desgraça puramente mundana. Penso num medo mais metafísico, um medo que penetra na alma através da experiência dos piores males a que a vida nos submete: a traição dos amigos, a morte daqueles que amamos, a descoberta da crueldade que se agasalha no comum das pessoas.

Bertrand Russell - Autobiografia











Descubra seu próprio jardim

 

Enfeite-se com margaridas e ternura e escove a alma com leves fricções de esperança. De alma escovada e coração estouvado, saia do quintal de si mesmo e descubra o próprio jardim. Sorria lírios para quem passe debaixo de sua janela. Ponha intenções de quermesse em seus olhos e beba licor de névoa de borboletas, cada qual trazendo uma pérola falante a dizer frases sutis e palavras de galanteria.

Carlos Drummond de Andrade





Imagens:

Fotografia de Annie Leibovitz

e Arte de Gustave Klimt





quinta-feira, 8 de maio de 2025

O rio e o oceano

 



Dizem que antes de um rio entrar no mar, ele treme de medo. Olha para trás, para toda jornada que percorreu, para os cumes, as montanhas, para o longo caminho sinuoso que trilhou através de florestas e povoados, e vê à sua frente um oceano tão vasto, que entrar nele nada mais é do que desaparecer para sempre. Mas não há outra maneira. O rio não pode voltar. Ninguém pode voltar.
Voltar é impossível na existência. O rio precisa se arriscar e entrar no oceano. Somente ao entrar no oceano o medo irá desaparecer, porque apenas então o rio saberá que não se trata de desaparecer no oceano, mas de tornar- se oceano

Osho




Fotografia Fine Arts





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