Para sempre me ficou esse abraço. Por via desse cingir de corpo minha vida se mudou. Depois desse abraço, trocou-se, no mundo, o fora pelo dentro. Agora, é dentro que tenho pele. Agora, meus olhos se abrem apenas para as funduras da alma. Nesse reverso, a poeira da rua me suja é o coração. Vou perdendo noção de mim, vou desbrilhando. E se eu peço que ele regresse é para sua mão peroleira me descobrir ainda cintilosa por dentro. Todo este tempo me madreperolei, me enfeitei de lembrança. Mas o homem de minha paixão se foi demorando tanto que receio me acontecer como a ostra que vai engrossando tanto a casca que morre dentro de sua própria prisão. Certamente, ele passará por mim e não me reconhecerá.
Mia Couto,
in Na Berma de Nenhuma Estrada
Imagem via Pinterest
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