sábado, 29 de fevereiro de 2020

Delicadezas




Pensa no grau épico de dificuldade de modelar um véu sobre um rosto num material que está entre os mais duros do planeta, o mármore (mineral de dureza 3 – escala de Friedrich Mohs). Outro problema é que o mármore não tem adição. É uma escultura 100% feita por subtração. Por isso que dizem que para esculpir uma figura, você pega o bloco e “simplesmente tira tudo que não é a figura dele”.





Crédito da imagem: arte de Giovanni Strazza





Poesia do dia

 

Sabemos vender sorrisos e mãos
corpos vazios ou completos às sedes redondas e ferozes
sabemos vender a língua que nos adeja pela pele
sabemos vender tudo que por dentro se move e até
o que se gastou entre segundos de um tempo infinito
mas nunca descobrimos o que fazer com o amor
que a brasa do anos de embalo não consome.
 
Sofia Loureiro dos Santos



Imagem da Web




Teu nome na praia



Espero por ti cá em baixo enquanto a paciência azul das ondas escreve o teu nome com gestos de alga na praia.

António Lobo Antunes




Imagem da Web




As marés montantes do passado




Hoje encontrei dentro de um livro uma velha carta amarelecida,
rasguei-a sem procurar ao menos saber de quem seria...
Eu tenho um medo
horrível
a essas marés montantes do passado,
com suas quilhas afundadas, com
meus sucessivos cadáveres amarrados aos mastros e gáveas...
Ai de mim,
ai de ti, ó velho mar profundo,
eu venho sempre à tona de todos os naufrágios!

Mário Quintana




 

Crédito da imagem: Arte de John Everett Millais




quinta-feira, 27 de fevereiro de 2020

Civilização de solidões



Somos uma civilização de solidões que se encontram e desencontram continuamente sem se reconhecer. Esse é o nosso drama, um mundo organizado para o desvínculo, onde o outro é sempre uma ameaça e nunca uma promessa.

Eduardo Galeano




Desconheço a autoria da imagem




Eis o homem

 

Da maciez de uma esponja molhada à dureza de uma pedra-pome, existem infinitas nuances. Eis o homem.

Honoré de Balzac






Imagem da Web







Transparência do olhar




No primeiro encontro as almas se reconhecem através da transparência do olhar. Silenciosamente se aproximam, apaixonam-se... Sem a necessidade do tocar. Humanamente iniciando o principal objetivo. O desejo. Provar o gosto da doçura que tem o sabor de um beijo. Em delírios a pele arrepia-se, ardentemente vibra em sensações jamais sentidas. Beijamos com os olhos para depois degustar a boca. E saciar o prazer do corpo. Entrelaçados na mesma emoção o amor de outras vidas volta a habitar dentro do mesmo coração.

Tom Flavio





Desconheço a autoria da imagem





Somente a solidão me acompanhava




Ergui-me e tomei o rumo de minha pensão. A lua brilhava. Meus passos ecoavam pela rua vazia, parecendo os passos de um perseguidor. Olhei ao redor. Eu estava enganado. Somente a solidão me acompanhava.

Charles Bukowski in “Factótum"





Crédito da imagem: fotografia de Leszek Bujnowski




Preciso de ti para um poema



Ofereço-te em troca o meu auto-retrato sincero. Tenho quarenta livros prontos para serem lidos. Tenho uma estratégia infalível para implementar a primavera. Tenho a segurança de um corpo cheio de insônias, pele de galinha, súbitos arrepios, termômetros para novecentas febres, saliva muito devagar, pés descalços, arrebatamentos incomunicáveis, fins de noite numa garrafa de vinho, estilhaços de quatrocentos orgasmos, comoções, paixões flagrantes, primeiros cuidados para jovens suicidas, lâmpadas que se queimaram nas minhas próprias mãos.

Vasco Gato




Crédito da imagem: Fotografia de  Brett Walker








sexta-feira, 21 de fevereiro de 2020

Manter a pedra no chão


 
... 
Não custa nada esperar dois dias, tenta entender por que está sentindo tanta raiva, amadurecer a opinião para não se machucar e não machucar ninguém, cicatrizar o mal-estar com silêncio.
...

O mais difícil na vida não é jogar a pedra, mas manter a pedra no chão.

Fabrício Carpinejar







Amas a ti mesmo


 

- Amas-me? - perguntou Alice.
- Não, não te amo! - respondeu o Coelho Branco.
Alice franziu a testa e juntou as mãos como fazia sempre que se sentia ferida.
- Vês? - retorquiu o Coelho Branco - Agora vais começar a perguntar-te o que te torna tão imperfeita e o que fizeste de mal para que eu não consiga amar-te pelo menos um pouco. Sabes, é por esta razão que não te posso amar. Nem sempre serás amada Alice; haverá dias em que os outros estarão cansados e aborrecidos com a vida, terão a cabeça nas nuvens e irão magoar-te. Porque as pessoas são assim, de algum modo sempre acabam por ferir os sentimentos uns dos outros, seja por descuido, incompreensão ou conflitos consigo mesmos.

Se tu não te amares, ao menos um pouco, se não crias uma couraça de amor próprio e de felicidade ao redor do teu Coração, os débeis dissabores causados pelos outros tornar-se-ão letais e destruir-te-ão.
A primeira vez que te vi fiz um pacto comigo mesmo: "Evitarei amar-te até aprenderes a amar-te a ti mesma!"

Lewis Carrol, em Alice no país das maravilhas





Sempre eu e você


 

(...)

Tudo chega em duplas. Vida e morte. Dor e prazer. Sal e açúcar. Eu e você. Esse é o equilíbrio do universo. Transformar estranhos em amigos. Transformar amigos em estranhos. Aprender que sorvete de menta com chocolate dá um jeito em quase tudo. E nas dores que não têm jeito sempre terei o colo da minha mãe. Precisamos aprender a focar no calor humano. Sempre. Mergulhar nosso corpo nele e virar versões melhores para o mundo. Se não formos gentis uns com os outros como é que vamos ser gentis com o desespero que mora em nós mesmos?

R. Kaur 




Crédito da imagem: ilustração de Julia Lillard







Meu presente para ti


 

E aí, baby, você me pediu uma foto, nua ou seminua, e eu não tinha e nem sabia mandar inbox. Então te mando essa, eu não sou ela, não tenho toda essa beleza rara das deusas! Mas por dentro e na essência que se derrama pelo meu corpo de mulher, eu sou exatamente ela! Dou a ti esse presente, que é único e só pra você, porque com qualquer outro já seria outra, mas contigo sou esse esplendor de erotismo e sensualidade! Toma ele (o presente) e a mim com toda fome e sede que puderes conceber! Toma ele e a mim como se fosse uma religião! Toma ele e a mim com todo teu tesão! Toma ele e a mim como se fosse joia rara! Toma ele e a mim como flor nascida nos Alpes! Toma ele e a mim como bicho em extinção! Como doce caro! Como vinho raro! Mas também me pega sem pudor, como coisa barata, que se acha na esquina! Como coisa vadia, que os gatos trazem na boca! Como coisa gostosa, que nem brincadeira de criança! Porque agora me dou em tuas mãos, como luva, como unha, como a mais fina cutícula! E não se engane, eu não sou boazinha, faço isso por interesse, pra que você vá se aquecendo com essas mãos nas quais eu me derreterei no mais puro mel!

Cari Lobo




Crédito da imagem: Marilyn Monroe, pelo fotógrafo Bert Stern




Dos meus livros



 "A Obscena Senhora D", de Hilda Hilst


 

Senhora D, o Mal não foi criado, fez-se, arde como ferro em brasa, e quando quer esfria, é gelo, neve,tem muitas máscaras, por sinal, não gostaria de se desfazer das suas, e trazer a paz de volta à vizinhança?

e como é o corpo do Mal?

de escuridão e ouro...





Indispensável ter o coração potável

 

Tem gente que não vale a luta, não compensa o movimento. Quem não escolhe é escolhido. Tenho andado mais na minha, o que não quer dizer que virei adepta do ostracismo. Considero limitado quem não desafia os meu limites. Sempre que algo me move, ouso mergulhar no universo de quem me interessa. À primeira vista pareço difícil, mas sou fácil para quem não tem preguiça. Quem confunde posicionamento com agressividade, precisa entender que o mundo tá cheio de indecisos. Mulheres bem resolvidas, afugentam uns, e a outros, despertam a libido. Raros são os que conhecem meu lado cem por cento receptiva. De natureza proativa, não peço, vou e faço. Quando quero muito, conquisto, abro caminho, meto o pé na porta quando o caso necessita de um respiro. Mas tem uma hora que pra chegar junto, o outro precisa mostrar que está vivo e fazer a sua parte. Por isso, coloquei na fachada um aviso pra quem quiser entrar: " Indispensável ter o coração potável! "
∑s.FuLL⚡️

Full Marinez 



Sempre em alarme



O amor deixa-nos sempre em alarme.
Alarma-nos quando começa, ou quando não é correspondido; alarma-nos enquanto dura, e mesmo que seja correspondido; alarma-nos quando acaba e nos dói; e continua a alarmar-nos mesmo que tenham passado mil anos desde o dia em que acabou.

Domingos Amaral, "O retrato da mãe de Hitler, Lisboa, 1945"



Crédito da imagem: arte de Odd Nerdrum




Parabólica de maluco

 

Estou doente. Vou morrer. Digo isso todos os dias: de Amor e Apoplexia. Ah, e de Leishmaniose. Porque acho bonito dizer APOPLEXIA E LEISHMANIOSE
Mas estou doente, de fato. A imunidade esfregando a minha cara no azulejo do banheiro. Tomo vários remédios, vários, porque gosto de farmácias e de medicamentos. Feito balinha de alcaçuz.
Sou a sonsa com bom senso
Antena da praça
Parabólica de maluco
Artista endividada até os ossos (já devo uns 30 mil no Itaú,
cheirei 2 terrenos em menos de um ano e por aí vai)
Absolutelly blind e salta pocinhas
Sempre rindo porque já chorei tanto que acabei desidratada; o sofrimento cansa, é chato, incomoda, a gente fica inconveniente, carente crônico, um porre! Ninguém gosta.
Minha boca está seca, hoje estou muito incoerente. Não sei como termino esse texto.
Acho que quero livrar alguém do castelinho de ilusões, floresta de espelhos.
Acordar Alices.

Daqui vou direto pra internação.

Ana Farrah Baunilha



Crédito da imagem: ilustração de Leonor Fini




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